O Home Office veio para ficar? Duas empresas do setor da construção civil contam suas experiências e traçam um balanço desse cenário de crise.
No meio corporativo, elaborar um planejamento, em tempos de coronavírus, sem imaginar o sistema de trabalho remoto, seria um verdadeiro cenário de desemprego. Aqui no Brasil o método ganhou força, principalmente em março de 2020, quando empresas iniciaram a migração do sistema de trabalho fixo para o doméstico.
No início de janeiro, uma pesquisa feita pela Alelo Hábitos do Trabalho, apontou que para 49% dos brasileiros o trabalho remoto é um modelo dos sonhos. Só que infelizmente nem todo profissional pode trabalhar neste formato e nem toda a empresa consegue um resultado positivo.
Para entender como empresários e colaboradores enfrentam esse cenário, o Portal C3, conversou com, Daniel Toledo, sócio Diretor da KV Arquitetura, e com Marco Rolleri- CEO e Diretor Geral da Ibratin. Entre os assuntos falamos sobre as principais estratégias para equilibrar a crise financeira e conversaram sobre as possibilidades da possível permanência do trabalho remoto.
Embora nossos personagens tenham experiência em gestão de negócios, existem fatores a serem considerados – logística, imagem e colaboração.
KV – Do planejamento à ação
A KV arquiterura – Königsberger Vannucchi Arquitetos Associados, possui escritório fixo na zona sul de São Paulo, conta com 78 membros. O primeiro desafio da empresa foi planejar a migração de toda a equipe do escritório para casa: “como fazer essas pessoas enxergarem a urgência?”, segundo Daniel Toledo, o primeiro passo foi priorizar quem era ou morava com familiares dentro do grupo de risco.
Em 16 de março de 2020, o Ministro da Economia, Paulo Guedes disse que era preciso encontrar um meio-termo entre pessoas ficarem confinadas por conta da pandemia do novo coronavírus ou sair para trabalhar. “Se ficar todo mundo em casa a economia entra em colapso. Se ficar todo mundo na rua também tem problemas, deve ter um meio-termo”, destacou, em coletiva no ministério da Economia.
“Eu acompanho esse caso desde janeiro e logo no início de março, dia 02, montamos uma estratégia: até o dia 18, as pessoas deveriam estar em casa.”, conta Daniel sobre as primeiras ações.
Embora fosse uma novidade para alguns, desde 2019 dois funcionários da KV já trabalhavam direto das suas casas.
A certeza do caminho escolhido aconteceu em 09 de março, quando um time inteiro, que não apresentava sintomas, iniciou o trabalho remoto. A partir desse momento foi possível entender como ficaria a dinâmica. “Isso foi dando as pessoas compreensão da situação e ao mesmo tempo segurança.”, conta Daniel Toledo.
“Tudo passa a ser como se você estivesse no escritório, você enxerga o BIM Server, arquivos BIM, consegue trabalhar colaborativamente com outros escritórios, tem acesso ao servidor e os app que utilizamos no dia a dia, e tudo no escritório é duplicado: 02 servidores, 02 firewall, 02 links de internet e 02 nobreaks. É tudo duplicado e o ambiente é virtualizado.” Descreve Daniel Toledo sobre o atual cenário da empresa.
Nesse aspecto, o CEO conta que a equipe não apresentou dificuldades pois o grupo mantinha uma cultura colaborativa.
Tempo Otimizado
Na maioria das empresas uma das principais dificuldades é manter um bom relacionamento interpessoal e otimizar o tempo. Em partes o desejo de muitos diretores tornou-se realidade com o novo sistema de trabalho.
Para Daniel Toledo, a quantidade de tempo disponível para projetar, aumentou muito, além de enxerga a solução para a queda na produtividade. “O excesso de supervisão diminuía a produtividade, com isso as pessoas não conseguiam explorar o limite do desconhecido e do aprendizado, no time eu notei um desenvolvimento nos potenciais e a confiança entre as pessoas aumentou.”, descreve o CEO.
Com a falta de contato visual, nasceu um sistema de trabalho onde o gerente ou supervisor reaprendeu a solicitar as atividades.
Qual o nível de home office permanece?
A maioria das vezes em que uma empresa muda de endereço, uma parcela do quadro de funcionários precisa entrar à nova rotina.
Vale lembrar ainda que empresa arca com os custos da transferência, sendo ela provisória ou não, (art. 470 da CLT).
Foi um ponto positivo da crise, o home office abriu novos horizontes.
“Existem bons profissionais em outros estados, que não podem se mudar, arquiteto com vínculos familiares, por exemplo, pense que as pessoas poderão morar no interior, com o custo de vida baixo e qualidade de vida.”, relata o CEO da K.V.
Uma empresa ítalo brasileira
Quando os primeiros rumores do COVID-19 apontavam no Brasil, Marco Rolleri e seus colaboradores já tinham um plano traçado.
A higienização com álcool em gel, por exemplo, já era aplicada nas duas fábricas e nos escritórios.
No dia em que receberam a notícia do governo sobre fechamento do comercio, já tinham desenvolvido uma política interna de trabalho de boas práticas e de home office.
Planejamento estratégico – um passo à frente
A metáfora “organismo vivo”, é amplamente empregada para explicar a organização diante de uma perspectiva. Assim como os seres vivos, as empresas buscam a vida, a sobrevivência, a longevidade, e a melhoria contínua. Mas, qual será o caminho onde eles se encontram em meio à pandemia do COVID-19?
Diante de todas as perspectivas positivas para o ano de 2020, a maioria dos empresários e gurus financeiros tiveram que enfrentar um novo problema de saúde pública com consequências avassaladoras para o mercado financeiros.
Os sócios fundadores, Luciano Rolleri e Giovanni Bracco, vieram da Itália e durante todo o tempo a empresa manteve entre seus contatos e familiares, profissionais que trabalham na Itália. Por esse fato estiveram um passo à frente em relação as notícias sobre a realidade na Europa.
A primeira etapa foi separar o quadro de funcionários da sociedade.
“Joguei meu turno que antes era as 7h30 para as 08h20 e subdividi em cinco turnos de 20 min. Hoje entram 20 pessoas, em cada intervalo e utilizam as dependências da empresa sem aglomeração – vestiário, refeitório e área de produção.”, descreve Marco Rolleri.
Um sistema de trabalho pioneiro, Marco não soube de outras empresas que apostaram nesse modelo.
Na segunda semana de março, parte dos funcionários levaram para casa o computador portátil da empresa. Para os funcionários que não tinham estrutura, providenciaram uma estação de trabalho com internet, equipamentos e suporte técnico.
Para assegurar empresa e funcionário, que a colaboração seria mantida, elaboraram um Manual de Práticas Home Office.
Em duas semanas cem por cento dos colaboradores em escritório, estavam em casa.
Suporte para equipe
A preocupação com a estrutura não era o único fator, além de preparar, organizar e informar a equipe, foi imprescindível olhar o lado familiar.
Se por um lado o funcionário que trabalha em casa, não necessita do Vale Transporte (VT), o acréscimo de itens na cesta básica diminui o choque no consumo de alimentos: “mesmo para aqueles que não ficaram em casa, pensamos nos filhos, nos pais, enfim, o número de familiares aumentou e isso era o mais importante, o bem estar das pessoas. Nossa cesta básica foi reorganizada, hoje ela vai com mais itens.”, explica Marco Rolleri.
Para os funcionários das fábricas, Maceió, com 75 colaboradores, e em São Paulo, com 140 colaboradores, foi tranquilo transmitir e acompanhar a rotina. O desafio foi manter as informações para centenas de representantes comerciais espalhados em vinte e quatro cidades brasileiras.
“Fizemos um manual de boas práticas para a minha equipe comercial, foi distribuído em todas as cidades do Brasil onde temos lojas e representantes, além da criação de um documento, assinado pelo presidente, que proibia reuniões presencias com mais de três pessoas em ambientes fechados”, afirma Marco Rolleri.
Instabilidade no transporte e as estradas
O início das notícias sobre o fechamento e abertura de estradas, não afetaram diretamente a empresa. O que de fato houve foi que algumas transportadoras ficaram impossibilitadas de carregar, com os rumores que fechariam as estradas com acesso à Minas Gerais.
Para conter situação emergenciais, todos os dias, gerência e diretoria, entram em conferência para discutir sobre as ações do dia e apontar soluções. Uma das normas é que nenhuma decisão é tomada com menos de 24 horas, o que possibilita à equipe realizar um balanço das ações corporativas. Ao todo são 8 pessoas que ficam a maior parte do tempo responsáveis em gestão de crise.
Trecho Norte da BR-101 no estado do Rio — Créditos: Autopista Fluminense.
Gestores preparados
Um fator que pode ser mais grave para o cenário corporativo é visualizar a reversão no faturamento. Qual será atitude dos empresários? Ambos passaram pelas crises de 2008 e 2014, e com elas adquiriam muita experiência. Apontam um possível aumento de turno e já preparam novos colaboradores que passaram por processo seletivo virtual. Descrevem que é um problema mais operacional do que econômico.
Haverá uma transformação para o nível de relação e colaboração entre as empresas, os processos integrados ganharão agilidade e o saldo enxerga pontos positivos.
Concordaram que não é possível subestimar uma crise e que o pior cenário será a paralisação da construção civil.