Entrevistamos o fundador da Cubicon, Jonas Medeiros, sobre as vantagens dessa estratégia e o mercado brasileiro. Quando falamos em otimizar operações, aumentar padrão de segurança e agregar mais qualidade aos projetos, o conceito de construção modular tem se tornado cada vez mais recorrente entre os profissionais que desejam evoluir na construção civil.
Em países asiáticos como China e Japão, por exemplo, esta tática é muito utilizada. Os números apontam que por ano os japoneses constroem 14 mil casas, uma média de 40 casas por dia, uma linha de produção padronizada.
Com o objetivo de aprofundar os detalhes desse cenário, o Portal C3 – Clube da Construção Civil, conversou com Jonas Silvestre Medeiros, Doutor em Engenharia de Construção Civil e ex-professor da Escola Politécnica da USP. Foi também coordenador do Manual de Tecnologia de Vedações e Revestimentos para Fachada pelo CBCA e autor do livro “Construção: 101 Perguntas & Respostas”. É professor convidado do Mestrado em Habitação do IPT e diretor da INOVATEC CONSULTORES ASSOCIADOS, empresa pioneira no projeto de fachadas ventilada no Brasil. Fundador e CEO da CubiCon, a primeira startup brasileira de construção modular.
A empresa tem experiência com essa estratégia nas áreas residencial e comercial, mas, frente a carência do nosso cenário hospitalar, no último mês receberam solicitações de orçamentos de prefeituras e empresas privadas. O empresário contou sobre os prós e contras da Construção Modular (CM).
Confira:
1 – A empresa já tua no campo da construção modular com residências, comércios e módulos para hospedagem. Quais são os aspectos da construção modular?
Jonas Medeiros: Nós começamos a divulgar que temos condições de fabricar módulos para enfermaria há 15 dias. Fizemos isso apenas pelo LinkedIn e outras redes sociais, e logo depois começaram a chegar consultas.
A arquitetura precisar ser concebida para maximizar as vantagens dos módulos pré-fabricados. Isso reduz custos e a velocidade de fabricação e montagem. Se o projeto aproveita as dimensões e ideias para o transporte, por exemplo, o valor do frete por m2 é reduzido. Outro fator é a repetibilidade dos componentes. Quanto mais se padroniza, melhor, sem precisar impor que todos os módulos sejam iguais.
Um dos aspectos e mais interessantes da CM, e que a diferencia da pré-fabricação, é a possibilidade de aplicar os preceitos da customização em massa, já utilizados em outras indústrias mais evoluídas. É possível padronizar componentes sem padronizar o produto, rompendo com um paradigma antigo da pré-fabricação. Na CubiCon podemos projetar e construir praticamente qualquer tipo de edificação utilizando a mesma base de componentes e produção, por exemplo: o mesmo chassi de aço desmontável que estamos usando para os módulos de hospedagem, residências e edifícios urbanos de baixa altura, usamos para os módulos hospitalares. No entanto, todos os outros componentes de vedação e acabamento são diferentes.
Os módulos para compor hospitais tem um “envelope” mais simples do que tínhamos projetados antes. Fizemos de painéis “termo-isolantes” para salas limpas (SL), e com isso facilitamos muito o tempo de fabricação e montagem. Nos outros módulos da empresa o conceito era obter um acabamento de obra tradicional e por isso tínhamos mais etapas. Ressalto que 100 % dos componentes são fabricados no Brasil por grandes indústrias multinacionais instaladas aqui, como a Saint Gobain, Kingspan, Tarkett e ArcelorMittal, o que garante fornecimento contínuo e grandes volumes, se necessário. A tecnologia de produção da CubiCon é própria, mas não inventamos nada do zero. É muita presunção achar que vamos inventar a roda por aqui. Tem muita coisa sendo feita em vários países que podem servir de inspiração. Para criar a startup eu me inspirei principalmente no modelo japonês de CM, já consolidado há décadas. Mas utilizei também outras referências europeias e até do Chile onde o assunto já não é novidade.
Módulo básico para 5 leitos. Créditos: Site Cubicon.
2 – Alguns especialistas descrevem que alguns processos no modelo brasileiro da construção civil é obsoleto e arcaico. Quais as vantagens de uma construção modular, para quem adquiri e para quem investe, e por quê a construção modular representa a “maior revolução da construção de edificações desde o advento concreto armado”?
Jonas Medeiros: O que é obsoleto e arcaico é o modo como produzimos partes importantes da obra como as vedações e revestimentos. O processo tradicional como um todo precisa ser revista, inclusive estruturas, mas não a introdução de novos materiais que vai trazer novas revoluções na construção. Na construção modular o que muda é a maneira de projetar e organizar o processo de produção. Isso se dá principalmente devido a pré-fabricação fora do canteiro de obras. Na construção “off site”, o processo se beneficia de muitas vantagens dos processos industrializados onde as atividades ocorrem sob abrigo constante da natureza, onde pode mais facilmente viabilizar a mecanização, reduzindo desperdício e sobretudo aumentando radicalmente a produtividade, nosso “calcanhar de Aquiles”.
As duas principais vantagens da CM é a redução do tempo de obra e o ganho da qualidade. Isso é vantajoso para quem investe e para quem compra. Para quem investe tem um aumento da liquidez com a redução do cronograma e para quem compra um prazo menor para a entrega. Por outro lado, uma pesquisa realizada no Japão demonstrou que apenas 3% dos compradores de casas pré-fabricadas o fazem devido ao menor prazo de entrega, e 78% optam por elas porque são de melhor qualidade e mais confiáveis.
Foi o paradigma do pré-fabricado de baixa qualidade que o Japão quebrou e é por isso que o modelo japonês é estudo por todos os outros países. Só de descobrir isso me voltei a entender primeiro como ocorreram estas mudanças por lá e como a indústria da construção ficou indústria de fato. Minha tarefa passou a ser a criação de conceitos paralelos com o que tem ocorrido com outros países e tentar encontrar modelos de produção mercadológicos que possam ser bem sucedidos aqui, uma sociedade tão distinta.
3 – Qual o número de empresas envolvidas em um projeto hospitalar de construção modular?
Jonas Medeiros – Na CubiCon procuramos conceber um módulo que possa ser montado à distância, sem depender de equipes especializadas. Assim, criamos um kit de produto pronto para ser montado sem depender de qualquer outro material a ser comprado no local. O Modulo Hospital que propomos resolve todo o envelope de uma enfermaria que pode ser transformar em uma UTI. Ou seja, não se trata apenas de estruturas ou coberturas para hospitais de campanha, fabricamos todos os componentes necessários o piso, as paredes e a cobertura, deixando o mesmo pronto para receber instalações hospitalares.
As paredes e pisos são do tipo “Sala Limpa” e atendem as exigências normativas e da ANVISA para unidades hospitalares. Na CubiCon Hospitalar outros produtos são entregues apenas na versão volumétrica 3D plug&play.
Estes grandes fornecedores entreguem uma série de componentes que solucionam praticamente tudo em termos estrutura, piso, paredes e coberturas. Há outros itens específicos, mas os principais correspondem a mais de 90% do total.
Vista interna da enfermaria completa para 20 leitos. Créditos: Site Cubicon.
4 – Por que esse modelo ainda não apresenta força no mercado brasileiro?
Essa transição é progressiva porque altera toda uma organização lógica de como o mercado funciona.
Leva tempo para reorganizar a cadeira de fornecedores, treinar projetistas e montadores. O processo de projeto e construção precisa ser adaptado pois a produção da fábrica e a logística de fornecimento impõe uma série de critérios e parâmetros que a construção tradicional não pratica.
Mesmo na maioria dos outros países a construção modular ainda está trilhando seus primeiros passos.
O caminho para a industrialização da construção é uma necessidade. Não podemos nos dar ao luxo de desperdiçar tantos recursos e nos estagnarmos. A CM representa hoje o caminho mais eficiente no sentido da industrialização.
O assunto ganhou as mídias depois que um relatório de uma grande consultoria internacional apontou a CM como a saída para a construção de edifícios, inclusive nos EUA onde tem sido largamente exaltada. Ainda estamos em fase de entendimento dos conceitos e do que precisamos fazer para darmos passos concretos. Por enquanto são poucas as iniciativas. Talvez o melhor exemplo seja hoje o de Cingapura onde há forte participação institucional e governamental para adoção da CM. Precisa repensar a tributação, legislação e outros aspectos além da engenharia para que este avanço se torne efetivo.
Enquanto os impostos dos materiais industrializados forem maiores que os tradicionais e ainda pensarmos na construção como absorvedora de mão de obra, pouco ou nada capacitada, vamos continuar a passos lentos.
O empresário afirma que uma vez que se viabiliza a industrialização dos processos, ninguém quer voltar atrás. “A CM permite fazer mais com menos. Seria jogar recurso fora e ninguém quer regredir. É como querer voltar à máquina de escrever em tempos de computadores ou consultar a enciclopédia em papel em tempo de internet.”, afirma Jonas Medeiros.
Sobre as interferências do clima tropical, Jonas recorda que na construção modular o que muda é a maneira de projetar e organizar o processo de produção.
“Em todos os países mais desenvolvidos existem normas próprias de desempenho justamente para estabelecer critérios que adequem as construções às condições climáticas particulares existentes. A CM é apenas um jeito diferente de produzir estas construções. Os critérios de desempenho são universais e qualquer meio de produção ou material precisam de observação.”, concluiu Jonas Medeiros, fundador da Cubicon.